domingo, 14 de outubro de 2012


Viver na escuridão


Deixei de ver...vivo na escuridão e a minha alma é negra!  O olfato chega longe. Tudo o que toco, é uma nuvem deserta de cor e transparente de cheia. Tenho apenas saudades dos cheiro da terra que faz eclodir um verde destilado dos maiores odores que alimentam a alma e nos transportam para o passado... trazendo consigo o que o cérebro fez por guardar intacto ao fim de anos. E no pensamento, continua o cheiro da maresia das algas expostas ao sol, ficou o cheiro a terra húmida e batida, continua o cheiro da faia que nos embala no sua doce essência do entardecer, o sal que a língua procura na prova do corpo que se torna mais saboroso, o cheiro a cocô, das tardes de praia, os pés exfoliados da areia que se infiltra e nos incomoda, o primeiro banho de mar a medo, com o frio a penetrar nos ossos, suspendendo o respirar à medida que vai subindo pelo corpo e nos para na cintura...e a mente relaxa e o sorriso aparece e os olhos focam ao longe o balançar no colo daquela ave que passa e os ouvidos reconhecem o chamamento do pássaro que teima em não se ir embora, e todos habitam no mesmo paraíso, mas nem todos o reconhecem...apenas os sábios e por demais pensadores e conhecedores das verdadeiras maravilhas que nos rodeiam, isto é amor no seu estado mais puro, é viver no seu sabor natural e é reconhecer o privilegio de viver. Por mais que viva, não conheço outra forma de viver, que não a minha...
 
av
14.02.12

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

O coração
 
Cada vez me capacito mais de que o coração é um órgão autónomo, desde o seu funcionamento, ao seu modo de pensar. Acho que o coração tem cérebro e pensa por si, independentemente do próprio homem que o possui.
São os passos mais duros, que nos destroem como se fossemos um muro de pedra, pedra suspensa em cima de cada uma delas, segura, coesa, firme, embora suspensa. Dói ter que dizer não, ter que resistir, e emoldurar um pensamento, como se de uma foto de família já defunta se tratasse. Quero que se dissolva como uma aspirina em água, sem que se dilua na dor. Nada nos pode trazer de volta o que jamais pensamos que um dia possa acabar. O caminho de volta está quase apagado, embora todos os sinais de tempos passados se encontrem intactos e vincados, no entanto apagados e sensíveis aos próximos invasores. Que a vida se regue de um balsamo de aromas de um comprimento sem fim e que consigam sobrepor todas os outros que ainda ecoam no sonho. São cheiros, são momentos, palavras e respirares de tão fundos quase findos. De tão puxados quase inexistentes...mas duradouros e sentidos. Foram-se.
av
04.10.12

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

http://notaveisazores.com

Aqui fica o site dos Notáveis dos Açores, é onde se pretende registar os muitos emigrantes açorianos e seus descendentes que se notabilizaram em diversas áreas. Achei interessante.

A Rosa

Rosa esperava a urbana de sacos na mão e como que descansando o peso todo do corpo numa só perna. Rosa fala sem parar, fala de si, da tonteira que sente no juízo, das mudanças que sente com o passar do tempo. Fala do seu médico, da medicação que toma e da palavra depressão. Acena com a cabeça a cada problema que tem. Pobre mulher. Em nova veio servir para casa do sr. doutor e dali foi servir para casa do marido. Rosa não tem carinho de ninguém, nem do marido, nem do enteado…de ninguém…
O olhar de rosa pasma no nada da sua vida…e a pausa é breve. Logo começa naquela ansia de falar…falar…sem parar. Tenho pena da Rosa, da sua vida, do seu vazio, da filha que já não é dela, da servidão que presta, da vassalagem que herdou da crueldade que a vida fez com ela. Rosa já não tem esperança e os seus olhos saem-lhe da cara no divagar da sua loucura. Rosa não teve direito à vida no seu sentido mais brejeiro, nem de brincar da rua…e na infância merecida…não teve o beijo nem o abraço de ninguém.

av
27.09.12