O Barco
Devia existir um barco pronto a
partir...encostado ao cais... para todos aqueles que no dia certo resolvem deixar
tudo e partir. Um barco destes não é fácil de fazer partir, todos os que por
momentos sentem esta vontade, muitas vezes não tem coragem de saltar, sem dia
nem hora de chegada. E olhando em redor, vêem-se olhos raiados de vermelho, sem
brilho, parados no tempo e nas batidas do coração. Tenho pena de quem não
espera muito mais de si. Eu também já senti o meu coração parado, no quadro do
menino que assiste à morte da sua própria mãe. Desolador e nefasto para quem
tudo teve e nunca precisou de partir nesse barco. Já vi partir, alguém que me
era muito querido, de olhar soberbo, de visão alargada e de objetivo múltiplo.
Empurrei, e ofereci-lhe todas as minhas reservas para que o sucesso dele fosse
uma certeza. Senti a sua ausência, o seu toque, o seu cheiro...e os meus
sentidos ficaram de luto. Foi uma falta inconsolável, amordaçada, disfarçada e
de visão nula mesmo à lupa. Ninguém viu que a minha alma se retalhava de tão
porosa que estava. Vi o barco partir e deixei…mas não embarquei nele! Talvez um
dia!
19.08.12
av
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